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quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

" O poeta não morreu/ Foi ao inferno e voltou"


"Todo mundo é parecido
Quando sente dor
Mas nú e só ao meio dia
Só quem está pronto pro amor...

O poeta não morreu
Foi ao inferno e voltou
Conheceu os Jardins do Éden
e nos contou..."

Meus comentários:

Com trecho desta música faço a analogia ao mito Orfeu.
Personagem de um mito em várias lendas, uma das atribuições de orfeu: Músico ao som de sua melodia enfeitiça os reinos: plantas, animais, homens e os deuses.

No verso "Todo mundo é parecido quanto sente dor", somos o que somos, independente da classe social, da raça, da crença. A dor chega e diante dos obstáculos buscamos uma saída para resolver o problema.

Orfeu sentiu a dor da perda, da separação. A narrativa mítica diz que: A sua amada Eurídice foi morta por uma serpente, quando fugia das investidas de Aristeu. Assim ele desce ao inferno e chega a obter dos deuses infernais a liberação de sua mulher. Mas com uma condição: Que ele não a olhasse antes de ela voltar á claridade do dia. Em dúvida, no meio do caminho, Orfeu se vira: Eurídice desaparece para sempre. Orfeu acaba os seus dias mutilados pelas mulheres trácias." IN: Chevalier, J. Cheebrant, A. Dicionário de símbolos. 17 ed.Rio de Janeiro: josé Olympio, 2002. p.662.

Na visão de Bravo (2000), o duplo, ao ligar-se ao problema da morte, uni-se, liga-se também ao desejo de sobreviver a ela. Este desejo da imortalidade, por sua vez, é gerado pelo amor a si mesmo e pela angústia da morte.

O ser humano busca, ao longo da existência, a reconciliação da terrível contradição existencial de constituir-se em um ser simbólico e espiritual e, ao mesmo tempo, encontrar-se aprisionado num corpo físico. Essa natureza paradoxal da condição humana liga-se á realidade da morte.

No mito de orfeu, ele viveu a morte porque desobedeceu, transgrediu. O olhar para trás é sacrilégio. Nem orfeu e Nem Eurídice tinham o direito de se voltarem na direção dos deuses dos infernos.

Na história de Ló, no Velho testamento. Gênesis (19:23), A mulher de Ló transgrediu a ordem e foi castigada, virando uma estátua de sal.

No verso: " O poeta não morreu/ Foi ao inferno e voltou"

Será que o poeta não transgrediu a ordem?

Termino com as palavras de Fernando Pessoa, ou seja, Alberto Caieiros:

"O espelho reflete certo; não erra porque não pensa.
Pensar é essencialmente errar.
Errar é essencialmente estar cego e surdo."

Bibiografia: Vidigoi, Ivete. O espelho e a duplicação do Eu.2005

Ceíce e Alcíone: os pássaros Alciônicos


caos
massa rude a indigesta
apenas peso inerte
desconjuntada semente da discórdia das coisas

terra, mar e ar

ciciam
confundidos

Paulo Leminski, in: Metamorfose, São Paulo, iluminuras, 1994.

Comentários:

O que tem de comum este versos da poética de Paulo Leminski, com o título: Ceíce e Alcíone, começamos pela fábula.


Nas palavras de Lange (1991), nos conta o mito de Céice e Alcione: Pássaros Alciônicos. Em que Ceíce era rei da Tessália, onde reinava em paz, sem violências nem injustiças. Era filho de Héspero. Ele estava muito triste com a perda de seu irmão, e então decidiu-se consultaro oráculo de Apolo.

De outro lado, a sua esposa Alcíone, filha de Éolo, o rei dos ventos, Ceíce e Alcione formavam um lindo casal, viviam na perfeita harmonia até Ceíce partir para Jônia. Em poucas palavras podemos dizer que o trágico aconteceu: Ceíce sofreu um náufrago e ele morreu afogado. Alcíone viveu dias longos de esperava, mas ela sabia da violência dos ventos, conhecia de perto o tenebroso vendaval, nem o seu pai consegui detê-lo.

Em longas esperas, Alcíone, com o seu tormento rogou a Íris: “Íris, minha fiel mensageira, vai até o domicílio do deus do sono e pede-lhe que mande uma visão, na figura de Ceíce”. E assim aconteceu. Sabendo que o seu marido já estava morto, Alcíone vai até a praia e metarmorfoseia em uma ave junto de Ceíce, agora ambos não são mais Rei e a Rainha, eles são pássaros. Alciônicos. Ela com o seu canto de lamento.

Imaginamos a benção de Éolo em conter a fúria do vento e fazer com que durante sete dias as ondas se acalmassem, para que Alcíone pudesse pôr seus ovos. Por isso também, é conhecido como os dias de Alcíone, a tranqüilidade do mar. Mesmo assim essa fábula na idade de ouro não tem o seu final feliz, diante dos olhos dos deuses Ceice e Alcione foram punidos pela vaidade, e por tal sacrilégio foram condenados a viver separados, Ceice tornou-se Alcatroz, vive no rochedo e Alcione em pássaro Martín pescador, que vive a maior parte pescando no fundo do mar.

Diante do mito dos pássaros alciônicos, podemos retirar várias reflexões, mas antes possamos afirmar que a semântica da palavra mito está repleta de significados, nos dicionários ela consta: “ narrativa tradicional de conteúdo religioso, que procura explicar os principais acontecimentos da vida por meio do sobrenatural” e em outros verbetes a relação da sua natureza dar-se com a arte e entre outras. E entre a razão, o mito é considerado um estágio menos evoluído do pensamento racional.

Antes de finalizar a minha reflexão quero ressaltar o aspecto do mito do sonho, na mitologia grega, Morfeu é o deus dos sonhos. Ele foi responsável por induzir o sono e os sonhos daqueles que adotam um aparência humana, ele que levou a certeza para a Alcione que Ceirce estava morto.

A desgraça é o amor?

"Mas, depois de se deter, reconheceu o seu amado:

Bate com viol~encia os seus braços inocentes, com audíveis lamentos

E, despedaçando os cabelos e abraçando o corpo amado,

Encheu as feridas de lágrimas e misturou ao sangue o seu pranto

Beijando-lhe o rosto gelado."

Met. XI, vv.650-653









quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Retrato



Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio amargo.

Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração
que nem se mostra.


Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
_ Em que espelho ficou perdida a minha face?

Cecília Meireles in Antologia poética - 3 ed.Rio de Janeiro:Nova Fronteira, 2001


Meus comentários:

A beleza da poesia esta na simplicidade das palavras, na poesia de Cecília Meireles - Retrato - em cada verso deixa claro a transformação do tempo em nós: "Eu não tinha este rosto de hoje,"
Como vários poetas diz "a água do rio não passa duas vezes no mesmo lugar", como a imagem: Eu não sou hoje, o que eu era antes... não estou falando da estética, sim do estado da alma.
"Nem estes olhos tão vazios"
O olhar é o espelho da alma, quando fica o vazio, o nada, temos várias possibilidades, se sente esta sensação, porque conheceu outra, do pleno, do cheio...Não existe a pior sensação de não sentir absolutamente nada..."Eu não sinto nem frio e nem calor." o eu-lírico enfatiza "tão", na ideia do além, o vazio amplificado, o vazio pelo vazio.

"Nem o lábio amargo"

Pela boca somos alimentados, no corpo, na mente e no espiríto,
a palavra nos liberta e nos aprisiona, o alimento traz os nutrientes, o amor acalenta os nossos medos.

Amargo oposto do doce, quando perdemos o encanto pela vida, o interesse, o re-começo, resta a amargura, o rancor, a ingratidão e a mágoa.

"Eu não tinha este coração/que nem se mostra."

Por que algumas pessoas tem medo,vergonha em dizer o que sente, em mostrar o coração, é preferivel mudar o coração, do que compreender, aceitar, buscar e perceber a própria estupidez.

O último verso nos provoca, e o eu-lírico nos questiona o que estamos fazendo com a nossa vida?
termino com os versos de Vinicius de Moraes

"A vida é a arte do encontro
Embora haja tanto desencontro pela vida".


O que nos faz sentir vazio? A falta de um amor, mas o que são as formas de amar e por que buscamos tanto e por que não nos satisfazemos com o pouco?


Ivete Vidigoi

sábado, 1 de janeiro de 2011


Sou

Sou o que sabe não ser menos vão
Que o vão observador que frente ao mudo
Vidro do espelho segue o mais agudo
Reflexo ou o corpo do irmão.
Sou, tácitos amigos, o que sabe
Que a única vingança ou o perdão
É o esquecimento. Um deus quis dar então
Ao ódio humano essa curiosa chave.
Sou o que, apesar de tão ilustres modos
De errar, não decifrou o labirinto
Singular e plural, árduo e distinto,
Do tempo, que é de um só e é de todos.
Sou o que é ninguém, o que não foi a espada
Na guerra. Um esquecimento, um eco, um nada.

Jorge Luis Borges, in "A Rosa Profunda"